
Justiça de gênero
Justiça de gênero, segurança e bem-estar
Rodrigo: As meninas são, na minha opinião, a população mais vulnerável no universo da migração. Em primeiro lugar, elas fogem de suas comunidades devido às desigualdades de gênero e à violência de gênero. Para muitas dessas meninas, a migração é sua única fuga.
Mas, uma vez que uma menina migra, ela sofre muita violência ao longo do caminho. Em suas comunidades de origem, as meninas não têm oportunidades de crescer. Mas, no trânsito, elas sofrem abuso sexual, exploração sexual, sequestro; e, ao chegarem ao seu destino, continuam a sofrer discriminação e violência. E se retornam às suas comunidades, não são aceitas. É um ciclo sem fim para elas.
Essa é a coisa mais difícil... para uma menina, o ato de migrar é uma experiência fortalecedora, mas ao mesmo tempo desencadeia muitos outros incidentes de violência, todos eles baseados em gênero.
Rodrigo: Tapachula fica bem na fronteira com a Guatemala. Muitas organizações internacionais estão lá neste momento, porque estamos vivendo uma crise de refugiados e requerentes de asilo. Milhares e milhares de pessoas de El Salvador, Honduras e Guatemala estão cruzando a fronteira, não no sentido clássico de perseguir o sonho americano em busca de melhores empregos — elas estão escapando da violência. Elas estão dizendo: "Preciso migrar porque senão vou morrer. Preciso fugir".
Isso é diferente da dinâmica migratória do passado. Antigamente, havia pessoas pobres se preparando para migrar ao longo de meses e anos — elas pesquisavam, economizavam dinheiro, contraíam dívidas. Elas sabiam que iriam migrar no futuro. Agora, vemos pessoas — de todas as origens socioeconômicas — que estão recebendo ameaças de gangues e largam tudo e partem em um dia, sem dinheiro, sem preparação.
Os impactos emocionais da migração são maiores, mais fortes e mais profundos. As pessoas sofrem muita violência em seus países, mas, ao mesmo tempo, não querem ir embora. Elas precisam se tornar requerentes de asilo, mas não conhecem os procedimentos. É muito difícil.
Precisamos começar a pensar em Tapachula como um corredor humanitário para migrantes e requerentes de asilo, porque vemos pessoas fugindo da violência o tempo todo. No início, eram apenas da América Central, mas agora vêm pessoas de todo o mundo.
[image_caption caption=”Rodrigo conduzindo um treinamento em direitos humanos com crianças e jovens no México. ” float=”alignright”]
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Rodrigo: A migração é uma questão muito complexa, com diferentes perspectivas. Não podemos encarar essa questão e todos concordarem: "Ok, este é um problema distinto e aqui está a solução". Não é tão fácil assim.
Como se trata de uma questão tão complexa, existem diferentes esforços com diferentes abordagens; não existe uma organização única e perfeita que faça tudo. Existem organizações especializadas em assistência jurídica para detentos. Existem outras organizações que empoderam jovens migrantes ou ajudam a preservar culturas indígenas. Outras são boas em advocacy federal.
Todos estão fazendo um trabalho incrível e a questão está recebendo muita atenção — nos EUA, mas também no México, com as eleições, e também na Guatemala, especialmente com a tragédia de uma guatemalteca de 20 anos morta pela patrulha de fronteira no Texas. Este é um grande momento, mas a maioria das organizações está liderando respostas muito individuais e isoladas. É por isso que esta iniciativa visa criar conexões e construir esforços coletivos.
Rodrigo: Em primeiro lugar, o simples fato de essas organizações se conhecerem já é algo grandioso. Vemos esses novos esforços coletivos no Sul, vemos tentativas de organização no Norte, mas são desconexos.
É por isso que a reunião se chama Unindo Fronteiras — porque organizações na Guatemala e no sul do México não sabem o que está acontecendo em Tijuana, Los Angeles e Houston. Queremos oferecer a elas uma linha direta entre si, para que possam ver o panorama geral. Precisamos entender o que está acontecendo com essas meninas. Portanto, conectar essas organizações — por meio de uma comunicação prática e cotidiana — é um objetivo enorme.
O segundo grande objetivo é desenvolver esforços transnacionais. Queremos construir uma advocacy coletiva e uma campanha midiática transnacional. Compartilhar ferramentas e protocolos pode ser muito poderoso.
Isso vai ser um experimento para nós. O foco em advocacy e a ênfase no impacto coletivo são muito novos para o Fundo Global para a Infância.
[image_caption caption=”Rodrigo capturou esta imagem enquanto conduzia uma oficina para jovens na Voces Mesoamericanas Acción con Pueblos Migrantes AC, que faz parte da rede de proteção à migração da GFC.” float=””]
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Rodrigo: Temos uma parceria muito boa com Fundação NoVoEles também estão em um processo de aprendizagem — não tentam ditar o que precisa acontecer. Querem ser informados e nos responsabilizar, mas eu realmente sinto que estamos todos em um estágio de aprendizagem, trabalhando juntos à medida que este projeto evolui. Eles esperam participar da reunião; acredito que esta será a primeira vez que estarão em Tapachula, o que, na minha opinião, será uma experiência profunda para eles.
Rodrigo: Eles estão animados e curiosos com muitas perguntas. Trabalhamos arduamente para planejar essas sessões com uma abordagem inovadora — queremos promover o diálogo, criar espaços dinâmicos, queremos que as pessoas se divirtam, conheçam a área e Tapachula. Quando contamos à Nicole [Nicole Ramos, Diretora do Programa de Refugiados da Al Otro Lado] que teríamos esse encontro em Tapachula, ela começou a dançar. Todos estão animados para conectar o trabalho, as fronteiras, o contexto, as pessoas.
Sobre Rodrigo
Rodrigo Barraza, Oficial de Programas da equipe das Américas, possui vasta experiência profissional com crianças e mulheres migrantes na região da fronteira sul do México. Ele trabalhou para organizações como o Centro de Direitos Humanos Fray Matías de Córdova e a Mesoamerican Voices, onde foi responsável pelo programa Crianças e Jovens Migrantes. Rodrigo é doutor em estudos de gênero e mestre em antropologia aplicada pela Universidade de Salamanca (Espanha), além de mestre em cooperação internacional pela Universidade Nacional de San Martín (Argentina). Falante nativo de espanhol, ele também é fluente em inglês.
Foto do cabeçalho: Esta imagem da fronteira EUA/México foi capturada durante uma visita ao Espacio Migrante, um parceiro da GFC em Tijuana, México, que está comprometido em capacitar comunidades migrantes, melhorar sua qualidade de vida, conduzir pesquisas sobre migração e conscientizar comunidades fronteiriças.